quarta-feira, 31 de agosto de 2011

VERDADES OU MENTIRAS?

SOMOS UM PAÍS PEQUENO?
Se compararmos a superfície de Portugal com as de outros estados da Europa, verifica-se que Portugal ocupa a 23ª posição numa lista de 53 países. Trata-se, portanto, de um território de dimensão média. O que provoca então o equívoco, tão entranhado, de que o nosso país é minúsculo? Provavelmente pelo facto de os nossos vizinhos mais próximos serem francamente maiores, a começar pela Espanha que tem cinco vezes e meia a nossa área. Quanto à população, Portugal ocupa o 44º lugar entre os países exclusivamente europeus, e a sua média de habitantes por quilómetro quadrado é 26ª da lista. Conclusão: o nosso país é um país europeu médio.
Mas porquê esta habitual insistência numa suposta pequenez? Só pode haver uma explicação: país pequeno deixa entender escassez de recursos, logo serve de desculpa à falta de iniciativa dos cidadãos e a inépcia governativa.
Ao admitirmos este fatalismo, que funciona como uma espécie de pecado original a que somos alheios, fazemos por esquecer que existem países mais pequenos que Portugal e francamente mais bem sucedidos (a Suíça, a Holanda!). Recorde-se que a Inglaterra tem, apenas, mais um terço, se tanto, da área portuguesa.
Pequenos, nós? Sim, de facto, mas por opção…


PORTUGAL: UM PAÍS DE BRANDOS COSTUMES?
Não é verdade. Só nos séculos XIX e XX contam-se por milhares os mortos em guerras civis e revoluções como atesta a História de Portugal. Foi o Estado Novo que inventou o chavão numa operação de acção psicológica.
Terreiro do Paço, Lisboa, 1 de Fevereiro de 1908: a meio da tarde desse dia, sob um pálido sol de inverno, D. Carlos, rei de Portugal, e o seu filho Luís Filipe são assassinados a tiro quando seguiam no seu landau. Lisboa, Outubro de 1910, dias 4 e 5: uma revolução derruba a monarquia e implanta a República. Sessenta a setenta mortos e quinhentos feridos. Barricadas nas rotundas, bombardeamento do Palácio das Necessidades, fuga para o exílio do rei, a sua mãe e avó. Lisboa, 14 de Dezembro de 1918, período da Primeira República: o ditador Sidónio Pais é assassinado a tiro na estação do Rossio, instalando-se uma crise permanente que apenas terminou quase oito anos depois com a Revolução Nacional de 28 de Maio de 1926 que pôs termo ao regime. No entanto, seria instaurada uma nova ditadura que duraria quarenta e oito anos que não foi de imediato um período pacífico pois as facções digladiaram-se a tiro durante dois meses causando setenta mortos no Porto, cinquenta em Lisboa e milhares de feridos.
Muito antes da violência do século XX, às atrocidades do tempo das Invasões Francesas sucederam-se as guerras civis e revoluções, com grandes batalhas e numerosas vítimas. E as guerras liberais no início do século XIX pela disputa da coroa portuguesa entre D. Pedro e D. Miguel?
Brandos, nós? Nem pensar…

A INGLATERRA: A NOSSA VELHA ALIADA?
Aprendemo-lo na escola e gostamos de o recordar às vezes quando referimos o casamento do rei D. João I (o Mestre de Avis) com a nobre inglesa Philippa de Lancaster (D. Filipa de Lencastre).
No entanto, estamos afectivamente ligados a diversos outros países. O Brasil vem, sem grandes hesitações, à cabeça: é o “país irmão (devia ser país filho mas a expressão seria ridícula se tivermos em conta que o “filho” é cem vezes maior que o “pai”…). Mas logo a seguir surge, historicamente, a Inglaterra pelos acordos e tratados políticos mais do interesse dos britânicos que dos portugueses. Depois, num fascínio recente, a Espanha pois, em tempos idos, todos sabiam que do país vizinho “nem bom vento, nem bom casamento” (os “acordos matrimoniais” entre os dois países conduziram mesmo à perda da independência portuguesa durante sessenta anos (1580- 1640).
Os soldados enviados por Londres se ajudavam, quando saíam não se iam embora sem antes terem praticado saques em povoações portuguesas, como já nos contava o escritor Fernão Lopes nas suas crónicas no século XV. Durante as Invasões Francesas, é verdade que Portugal conseguiu manter a independência face aos ambiciosos projectos de Napoleão graças à actuação do exército britânico mas a ajuda inglesa ficou a dever-se, em primeiro lugar, aos cálculos estratégicos da Grã-Bretanha, empenhada numa guerra contra a França e Portugal oferecia-lhe um campo de batalha privilegiado.

PORTUGAL: 500 ANOS EM ÁFRICA?
                Não estivemos. A nossa presença efectiva nas colónias africanas não excedeu algumas décadas. Segundo a teoria oficial do regime do Estado Novo, e a ideia -feita que já vinha da Primeira República, Portugal teria estado meio milénio no continente africano.
É certo que os primeiros contactos de Portugal com as costas africanas remontam ao século XV, e nisso fomos mesmo pioneiros. Mas o estabelecimento de feitorias costeiras vocacionadas para o tráfico de ouro, marfim e escravos não basta para que se fale colonização de países e povos.
Nesta perspectiva, só nas últimas décadas do século XIX e século XX, quando Portugal se envolveu nas guerras e África na chamada “pacificação” (quem não se lembra de ouvir referir, na escola, a destruição do Império Vátua do sul moçambicano e na vitória de Mouzinho de Albuquerque sobre o líder tribal Gungunhana?).
A importância histórica de Portugal está relacionada, não com a colonização, mas com a abertura da rota marítima para a Índia e os países asiáticos. Inauguramos contactos e trocas entre o Ocidente e o Oriente.
Quando muito a maior obra portuguesa no mundo terá sido a criação do Brasil, tal como ele hoje existe. E que preconceitos à parte, é mesmo “um imenso Portugal”!


(texto adaptado de publicação da revista “Visão” – 18 de Agosto de 2011)